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Yoga, Poesia, cursos, reflexões, pensamentos

O sentido de “retiro” no olhar do Yoga

Os seres
portadores da palavra
se tornaram tão ruidosos
que se perderam da palavra.
(Tales Nunes)

por Tales Nunes

A palavra abre um universo de possibilidades. A palavra é uma forma de brincar com a Vida. Porém, a Vida é sempre mais ampla. Chamo de palavra o som que carrega o sentido vivo, que se move junto com a beleza do Universo. Chamo de palavra a voz que está mais próxima da poesia. Chamo de fala o som que se reproduz sem presença e congela a realidade viva, dando-nos a ideia de que o Universo é fixo. A fala, como aqui a descrevo, mata a beleza, mata a novidade, mata o momento, em detrimento de sentidos mortos. Na fala, em vez de se recriar, o pensamento tende a se reproduzir, nela a liberdade é impossível. Os seres portadores da palavras se tornaram tão ruidosos que se perderam das palavras.


Para que não acreditemos na ilusão da estagnação dos sentidos e possamos nos mover a partir da apreciação imediata da Vida, precisamos, por momentos, nos afastar da fala. A fala nasceu antes de nós. Quando nascemos, a fala já circulava. Fomos inseridos na fala. Com isso, ganhamos novas possibilidades perceptivas e de afetos, ao mesmo tempo que muitas outras se reduziram. 


O sentido de “retiro” no Yoga é o afastamento necessário para o reconhecimento de que nós não somos a fala que circula ao redor, esses sons e sentidos que se reproduzem em nosso espaço mental. Um afastamento físico, um retirar-se das relações sociais imediatas, e um “afastamento do que se acredita ser”. 


Antigamente os yogis se retiravam em meio à natureza, nas florestas, nas montanhas, distanciado-se das falas das vilas. À medida que as vilas se converteram em cidades e o retiro na Natureza se tornou mais difícil, os yogis passaram a levar o lugar de retiro para dentro da cidade, os ashrams. Seja na natureza ou nos templos, o retiro é um encontro com um espaço mais amplo do que a fala. O lugar onde nasce a palavra, onde todos os sons têm origem. 


A meditação é tanto o retiro no retiro quanto o retiro na cidade. É a reprodução do momento de solitude na natureza ou no templo que pode ser evocado em sua casa, dentro do seu cotidiano. Nesse lugar de “afastamento”, abrimos o espaço para escutar o silêncio que tudo permeia. Podemos perceber que a nossa fala é apenas uma forma de se comunicar. A Natureza inteira se comunica. O Universo manifestado é um campo de diálogo extremamente complexo. As raízes, as folhas, as flores, os olhos, os lábios, a pele, a atmosfera, as águas se comunicam. Nós somos apenas uma forma de vida que participa dessa teia praticamente infinita de relação. Toda essa rede está fundada num silêncio ancestral. No silêncio que somos, onde nasce toda poesia.


O “retiro”, no Yoga, não tem o sentido de isolamento, ou de abandono da realidade, mas está fundado na possibilidade de descobrir o silêncio a partir do qual todos os sentidos são ampliados. A comunicação real, viva, ampla, sensível e profunda com a Vida nasce a partir da descoberta de um silêncio fundamental. O dom da palavra viva, da poesia, é o silêncio que ensina.

Tales Nunes, Florianópolis, 04 de abril de 2023

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Tales
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