por Tales Nunes
O deserto suscita atração e medo. Para muitos, o deserto é a ausência, a falta, a solidão, a dor. Para o Yoga, o deserto é um lugar que permeia todas as paisagens. Para perceber isso é preciso atravessá-lo. O deserto, no início da prática, é um convite. Muitos não aceitam esse aceno, por medo de estar só.
O deserto é o encontro com a dor, com as ilusões que criamos em nossas mentes e projetamos nos objetos do mundo. Quando não há esses objetos sobre os quais projetamos, nos vemos sozinhos com nossas dores e criações mentais. Isso pode ser libertador e assustador simultaneamente.
Ao passo que atravessamos esse primeiro contato com o deserto, de solidão e medo, ele se torna aceitação e acolhimento. Ele se torna o caminhar com o coração aberto. O céu aberto do deserto é o espaço na mente livre de qualquer objeto, a vacuidade luminosa.
Quando isso é contemplado, o deserto então se torna um lugar de retiro, de peregrinação, povoado pela vastidão e ao mesmo tempo pela possibilidade de recolhimento e lembrança do próprio caminhar.
Esse deserto segue conosco, em nosso coração, sempre. Ao retornar para o mundo dos objetos e sua diversidade de formas, o deserto está lá, a vacuidade está lá, permeando todas as experiências.
O deserto é a dor convertida em cura silenciosa, a solidão dissolvida em silêncio.
O silêncio profundo transformado em pura luminosidade.
O deserto é um lugar que permeia todas as paisagens. Para perceber isso é preciso atravessá-lo.
Nada floresce sem que atravesse o solo do deserto. O tempo de maturação e de maturidade. Uma habilidade, uma qualidade da mente, o caráter. O deserto é o tempo dedicado no silêncio de si para fazer florescer.
A poesia sensível, repleta de nuances de luz e de som, permeada por um silêncio ancestral está aí, no deserto.
A floresta está no deserto, o mar está no deserto.
O deserto está no mar, na floresta, em você.
Siga o silêncio.
Tales Nunes, Florianópolis, 20 de janeiro de 2024