por Tales Nunes
“A arte liberta,
ao elevar o indivíduo acima dele mesmo.
E engrandece,
ao trazê-lo de volta com um novo olhar”.
(Tales Nunes)
Há muito de arte no Yoga e muito de Yoga na arte. A inspiração artística é uma elevação. É um acender e ao mesmo tempo uma ascensão. Mesmo que expresse a dor, o artista, no momento da criação, salta sobre ela e a transcende, para torná-la materialidade. Quando expressa o sagrado, a arte reflete a própria fonte de inspiração. Quando expressa o cotidiano, é a partir do estranhamento do artista e sua capacidade de mergulhar e ao mesmo tempo ser não sendo completamente.
O artista é aquele que tem uma mente sensível e exatamente por isso tem a capacidade de olhar o mundo com a admiração da primeira vez. Consegue, assim, ver o que muitos não veem por mero alheamento. O milagre da vida está acontecendo a todo o momento, mas a mente insensível e o coração distraído não conseguem apreciar. Mas ao mesmo tempo a sensibilidade artística pode ser fonte de dor e sofrimento. Não é só de amor que se faz arte. O artista lança um olhar diferente sobre o que todos olham como trivial e tem a capacidade de transformar o seu olhar em arte, sentimento e visão compartilhada. O artista consegue transformar em arte não apenas uma gota de orvalho, o canto de um pássaro, mas também o sofrimento alheio, a desigualdade social, as angústias e questionamentos da vida humana.
Nem por isso, a arte deixa de ser uma chama divina de inspiração que na obra do artista alcança a sua materialidade. Como diz Patti Smith:
“O artista busca entrar em contato com a sua noção intuitiva dos deuses, mas, para criar seu trabalho não pode permanecer nesse domínio sedutor e incorpóreo. Ele deve voltar ao mundo material para fazer sua obra. A responsabilidade do artista é equilibrar a comunhão mística com o trabalho criativo”. (Patti Smith)
Mesmo quando expressa o lado sombrio da vida, de si mesmo ou do outro, o artista revela a si mesmo e o seu tempo. E ao fazê-lo já é um sopro de inspiração. Em meio a superficialidades, utilitarismos e ritmo frenético do dia-a-dia modernos, é preciso termos olhar de artistas. Devemos buscar a beleza como meio de transformação. É fundamental resgatarmos a contemplação, a nossa fonte de inspiração, que é exatamente a fonte da vida. Há gotas de infinito na condensação de cada momento, mesmo em lágrimas. É preciso criar, para se ter novos olhares. É preciso novos olhares para se criar novas possibilidades. O artista cria a arte, e ela constantemente o compõem. O artista não é apenas produtor e produto de sua própria obra, mas também de novas formas de ver o mundo, de viver e de se relacionar. A arte é fundamental em processos de transformação, sempre foi. Por isso muitos artistas foram considerados visionários, além de seu tempo. Exatamente porque ousaram criar coisas novas, sobretudo ousaram ver o mundo de uma maneira diferente. E nunca antes o mundo precisou tanto de novos olhares. Olhares mais amorosos, mais sensíveis.
Nos dias de hoje vejo o Yoga também como arte. Arte de fazer a pessoa reconhecer o belo em si mesma. E como resistência. Resistência a uma visão desencantada da vida. Nisso, arte e Yoga caminham juntos, cumprindo funções pessoais, sociais e sagradas muito semelhantes.
*Artigo originalmente publicado na edição 40 dos Cadernos de Yoga.
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Tales Nunes